'Sobre os Projetos de Extermínio' : evento reuniu mais de 100 pessoas na sede CDDH-Petrópolis
Presidente da Comissão Nacional da Verdade (CEV-Rio), Nadine Borges, participa de mesa de debate, na sede do CDDH.
Por Juliana Oliveira em 17.08.2014
'Sobre os Projetos de Extermínio' : evento reuniu mais de 100 pessoas na sede CDDH-Petrópolis
No seminário "Sobre os Projetos de Extermínio: da ditadura às juventudes negras no Brasil”, realizado pelo CDDH- Petrópolis e pela REJU-RJ nos últimos dias 15 e 16/08, a proposta era refletir sobre a violência praticada contra jovens negros nas periferias do país, herança deixada pelos anos de repressão, mas a pauta foi muito além.
Entre os assuntos abordados, estiveram em destaque a relação entre fé e política, a redução da maioridade penal, a criminalização dos movimentos sociais, a escravidão, o poder da juventude, a democracia, a 'Casa da Morte' de Petrópolis e a importância da criação de locais de memória.
De acordo com Rafael Coelho, membro da Coordenação Executiva do CDDH- Petrópolis e um dos idealizadores do evento, é preciso ter cuidado ao naturalizar esta realidade de violência e extermínio. “A gente fica repetindo, no senso comum algumas questões, e um dos perigos é uma determinada captura que vem sendo feita na luta pelos direitos humanos. Hoje estão pretendendo construir técnicos em direitos humanos, não mais militantes. É uma época perigosa", afirma.
Ao todo foram dois dias de atividades: apresentações artísticas, mesas de debate e muita interação. Na ocasião estiveram presentes representantes de diversos movimentos sociais, do Movimento Negro de Cabo Frio e da União dos Negros de Petrópolis, além da marcante participação de jovens.
No primeiro dia (15/08) a programação do evento contou com a apresentação do Coro Nheengarecoporanga (CDDH) e a fala sobre Fé e Política, do presidente do CDDH, o teólogo e escritor Leonardo Boff.
O segundo e último dia de seminário (16/08) começou com um café da manhã coletivo e um Sarau de Poesia, iniciado por jovens do Projeto ArticulAção (do CDDH) e aderido pelos participantes. Em seguida, foi realizada a mesa de debate sobre a temática central do evento. A atividade foi mediada pelo professor Raphael Capaz e composta por Rafael Coelho (CDDH) , José Geraldo (UNIGRANRIO), a presidente da Comissão Nacional da Verdade (CEV-Rio), Nadine Borges e Maria Teresa Piñero, da Comisión de la Memoria Histórica da Argentina, que falou sobre a importância da América Latina se manter unida. A militante, conhecida como 'Teté', é viúva de Angel Georgiadis, assassinado durante a ditadura na Argentina e, na ocasião, lembrou sobre o período de repressão no país e afirmou: "É impossível matar um povo" (tradução livre).
Após solicitar palmas e um grito em homenagem à juventude negra, o professor José Geraldo (Unigranrio) fez um resgate na história do país, enfatizando a relação com o negro desde a escravidão até o período atual. “O extermínio é um processo histórico no Brasil. A sociedade está pensada numa perspectiva branca”, disse. Antes de finalizar a fala José Geraldo fez um chamado: “Nós precisamos continuar vivos... Cada vez que a gente consegue mostrar conhecimento nós conseguimos diminuir o número de mortos”, concluiu.
Ainda nesta perspectiva Nadine Borges (CEV-Rio) propôs uma reflexão sobre o crescente número de jovens presos a cada ano no Brasil. "Nunca teve tanta gente presa. Prisão dá lucro. Não chega a 20% o número de jovens presos, em unidades de medidas sócioeducativas, que cometeram crimes contra a vida... A juventude é a melhor fase da vida. Se você encarcerar os jovens, o que vai acontecer?”, indagou Nadine Borges. “ A escravidão foi um negócio e a ditadura também deu lucro”, complementou.
No momento destinado a perguntas, diversas pessoas se manifestaram, contribuindo com a troca de experiências. Maristela Silva, (jovem remanescente do projeto Florescer e que atualmente faz parte do projeto ArticulAção, do CDDH e financiado pela Petrobras, falou sobre a importância dos jovens persistirem , mesmo que encontrem dificuldades. “ No início me incomodava muito quando falavam aqui, desse potencial que a gente tem, pois a gente não conseguia ver isso... Eu tinha muita garra, muita força, mas o quê se faz com isso? Hoje eu sei. É muito difícil. Mas eu continuo lutando”.
Com o olhar voltado para os jovens, Kenner Terra (REJU) falou sobre a campanha promovida pela Rede, contra o extermínio de jovens negros, que inspirou a criação do evento. Ele destacou a importância de se empoderar o jovem. “ Nós pensamos que quem ter que ter voz nesses espaços é a juventude que está morrendo. E para isso, é preciso criar espaços para o protagonismo dessa juventude”, finalizou.
O conteúdo de todo o seminário estará reunido na carta do evento, um documento de registro sobre o debate, que começou a ser elaborado durante as atividades da programação.